Tenho ponderado sobre como o amor se tornou conceitualmente separado da liderança. Por boa parte dos últimos 20 anos venho ministrando múltiplas palestras e seminários explorando a inteligência emocional, o autoconhecimento e a empatia no contexto da liderança, mas nunca falei sobre o coração e certamente nunca falei de amor.
Talvez não haja lugar para uma conversa sobre o amor se liderança for entendida como um gesto carismático que hipnotiza ou controla. Porém, neste momento da história, a conversa sobre liderança parece ir além do contexto entre comando e controle. Muitos de nós já reconhecem que com o grau de especialização existente hoje, a rapidez das mudanças, a transformação da cultura pelas mídias sociais, a ampla complexidade do ambiente dos negócios e os enormes desafios sociais que enfrentamos, colaboração tornou-se central em liderança. E no coração da colaboração está o amor.
Normalmente pensamos em amor como uma emoção. Existe o amor que é emotivo, normalmente conhecido como afeição. Em seu livro, "Os Quatro Amores" (The Four Loves), C. S. Lewis descreve afeição como a mais natural, emotiva e difusa forma de amor. Amor afeiçoado, no entanto, não é necessariamente sinônimo de colaboração. É o amor sem emoção - que é a compaixão - que está no cerne do verdadeiro processo colaborativo. A compaixão surge quando se reconhece algo universal sobre o outro, dissolvendo julgamento, separação e promovendo entendimento e unificação.
É uma parte essencial do agape, definido pelos gregos como a forma mais elevada de amor. Nesse caso, amor é um ato, não uma emoção. É um compromisso altruísta, espontâneo e inesgotante pelo bem estar do outro. É nesse amor que acontece o reconhecimento da verdade da interconexão entre toda a existência. Agape não é baseado em preferências, ou nossos gostos e desgostos. É o ser humano raro que desenvolve esse tipo de amor em todo seu potencial. Não obstante, todos nós nascemos com o desejo inato de desenvolver e promover amor desinteressado. Barbara Frederickson, em seu belo artigo "A Ciência do Amor" (The Science of Love) compartilha uma pesquisa demonstrando que o corpo está desenhado para amar: o amor energiza todo nosso sistema, amplia nossa mentalidade, intensifica nossa sintonia com o outro e aumenta nossa criatividade.
O amor que transcende nosso ego pessoal encontra um dos desejos humanos fundamentais - nossa ânsia por conectarmo-nos. Esse profundo desejo se estende não apenas aos amigos humanos, mas pela totalidade da vida. Todos nós desejamos estar palpavelmente conectados com a força da vida que está se revelando à todo dado momento. Muitas vezes encontramos esse imediatismo da conexão quando estamos na natureza. Sua beleza nos chama para o presente e nos desperta. Mas não precisamos de um certo estado emocional para viver essa experiência. Por exemplo, podemos estar em meio a uma perda devastadora e ainda assim experienciar um profundo senso de conexão.
Inspirar e mobilizar outros requer que o líder entenda onde a pessoa encontra a conexão nessa força da vida. Posso me sentir a mais apaixonada quando estou participando de um complexo trabalho conceitual, ou quando estou lecionando, ou quando estou organizando processos ou trabalhando com números. Quando líderes criam e asseguram alinhamento entre o lugar onde as pessoas se sentem conectadas e o trabalho diário que executam, reservas de energia e criatividade são liberadas. Essa força é o amor.
Nos negócios, muito comumente o egotismo é promovido como uma característica de liderança. Elevamos o homem do Malboro e cultuamos em egolatria o arquétipo do herói. Mesmo nossos jogos infantis celebram o individual e esquecem o barco do desprendimento ou qualquer coisa que chegue perto da colaboração, a exemplo da ansiedade provocada por esses jogos, manipulados para eliminar os perdedores, um a um. Quando promovemos egotismo nesse caminho, danificamos, subestimamos nosso senso de conexão. E nesses momentos se expande, desavisadamente, nosso senso de isolamento.
A nostalgia de estar conectado ao curso dos desdobramentos da vida está intimamente ligada à nossa nostalgia por servir. Quando nosso trabalho é, em sua maior parte do tempo, servir a si próprio(a), acabamos presos em um container pequeno demais para sustentar a profundidade de nossa capacidade, ou nossa nostalgia. Com o foco primordialmente em nós mesmos, não podemos encontrar satisfação, completude. Novamente, reforçamos o senso de isolamento que trabalha em oposição, como uma força contrária ao nosso desejo por conexão e os benefícios da colaboração.
Liderança que não tem por base a centralidade no amor perde a centralidade de nossa humanidade. Acabamos por tomar decisões que culminam em colocarmos máquinas de refrigerantes em escolas primárias ou vendendo fórmulas para mães de recém-nascidos em países pobres para promover faturamento.
Esse limitado foco está presente quando o retorno esperado dos funcionários da base ou do acionista é o valor mais alto. Nesse caso, o bem estar de um punhado de gente é elevado acima do bem estar daqueles que servem à missão da organização ou o que for melhor para a cultura como um todo. Colocar o valor do acionista como o valor mais alto inadvertidamente isola os acionistas e funcionários, e subverte a verdade da interconexão.
Para termos satisfação, senso de completude e sermos efetivos, nosso trabalho reconhece a interconexão com toda a forma de vida. Ao servirmos a um propósito maior, experienciamos diretamente o senso de conexão, e assim surgem bem estar, inspiração e gratidão. Em essência, inundamos nosso sistema com amor. Nossa liderança irá espontaneamente evocar inspiração como resultado.
Mas o comum é a abordagem da liderança através do medo, que pode assumir muitas formas, com diferentes níveis de sutileza. A mais simplista é mobilizar os outros através da ameaça, deixando claro para as pessoas o que necessitam delas e usando a punição como um meio de fazê-las cumprir a tarefa dada. Muitas famílias, organizações e instituições são conduzidas através da ameaça de punição. Ao dizer ao meu filho: "Melhor você recolher seus brinquedos ou vai para o seu quarto", estou usando a ameaça como um meio de obter ação.
Outra mais sutil é intimidar, inibir a autoestima de uma pessoa, seu senso de conexão, ou senso de ser valorizado. Incorporado ao meu tom quando digo ao meu filho "melhor você recolher seus brinquedos..." está a ameaça da remoção do amor ou a sugestão de que, se a criança não o fizer, ele(a) vai ser desvalorizado.
Liderança por meio da autoridade forçada mostra-se frequente e inadvertidamente nas atuais organizações. A ameaça de perda do emprego, a vergonha de cair abaixo dos colegas e parceiros de trabalho, quando alinhados competitivamente, ou incorrer na ira de um chefe são exemplos desse tipo de motivação. Essa é a antítese da liderança guiada pelo amor.
Para liderar através do amor, de uma forma que promova a colaboração, requer que os líderes forneçam uma conexão entre os trabalhadores e seus trabalhos, um senso de significado compartilhado, e um senso de propósito que vai além do autoengrandecimento de cada indivíduo. Assim, atraímos o substrato interconectado que corre por toda a existência. A liderança nesse caminho exige que os líderes estejam cientes de como seus egos pessoais bloqueiam o acesso ao amor mais profundo que está no coração do ser humano. Um amor que é invocado quando transcendemos nossos pequenos eus e servimos a humanidade.